Lucas contou à reportagem ter sido bastante prejudicado pela situação, principalmente para arranjar emprego. “Me acusaram e não provaram, eu não fiz isso [não roubou]. Não pude ser registrado em nenhuma empresa por causa disso, perdi várias vagas de emprego, me prejudicou”.
A juíza da 4ª Vara Criminal da cidade, Elizabeth Lopes de Freitas considerou as provas contra o jovem nulas e ressaltou que a PM o conduziu à delegacia dois meses após o crime do qual foi acusado sem flagrante e nem mandado de prisão.
“A partir da condução ilegal do réu à delegacia de polícia, toda prova colhida é nula, inclusive a prova produzida nesta audiência em especial o reconhecimento feito pela vítima. […] assim estabelece a teoria da árvore dos frutos podres, pois a prova nula contamina toda a prova posteriormente produzida”, destacou a juíza.
No documento, consta que o crime atribuído a Lucas aconteceu na madrugada de 21 de fevereiro de 2018. Na ocasião, ele foi acusado de, junto com outras duas pessoas não identificadas, ter abordado e roubado um condutor de um guincho na Rodovia Cônego Domênico Rangoni, no Centro, em Santos.
Ainda contra o jovem, existia a denuncia de que o crime teria sido cometido com armas brancas, de fogo e que a vítima de 50 anos, à época, sofreu graves ameaças. Dela foram roubados: celular, rádio transmissor e o uniforme da concessionária — tudo estava avaliado em R$ 1.129.
Em depoimento, a vítima disse que um homem fazia sinal na rodovia quando parou o guincho no acostamento. Dois homens saíram do mato e um deles bateu no vidro do passageiro.
Segundo a vítima, o homem estava armado e estilhaçou o vidro do guincho após disparar e, em seguida, apontou a arma em direção dele. Outro criminoso subiu ao lado dele e deu-lhe uma facada [este foi apontado como sendo Lucas] — o golpe não o perfurou.
Ele disse ao delegado, ainda, que foi retirado do caminhão e levado para o mato sob olhares de um dos homens, que estava com um machado, enquanto o que estava armado permaneceu à distância.
Foto da perícia mostra como ficou a viatura do guincho da concessionária após roubo na Rodovia Cônego Domênico Rangoni, em Santos, SP — Foto: Reprodução
Dois meses após o crime, Lucas foi encontrado na Rodovia Conêgo Domênico Rangoni, no Jardim Nossa Senhora de Fátima, em Cubatão, e conduzido à delegacia sem que houvesse mandado judicial ou flagrante que justificasse a ação da PM.
Na ocasião, ele foi indiciado e os agentes de segurança disseram que o reconheceram de um vídeo. No mesmo dia, o condutor do guincho informou ao delegado que recebeu uma foto de Lucas e o reconheceu como um dos autores do roubo, e foi à delegacia para reconhecimento pessoal.
Durante audiência em 30 de outubro deste ano, a vítima prestou declarações, duas testemunhas de acusação foram ouvidas e o réu foi interrogado. Após isso, a representante do Ministério Público manifestou-se requerendo a improcedência penal por insuficiência de provas.
Dessa forma, a juíza considerou que a ação penal é improcedente, pois a prova produzida durante a ação, incluindo a fase policial, é ‘absolutamente nula’, considerando a atuação dos PMs ‘totalmente ilegal e desastrosa’.
Para Elizabeth, a ação dos policiais em levar Lucas à delegacia foi em sentido contrária à lei e Constituição Federal. Segundo ela, os depoimentos prestados pelos agentes de segurança durante a audiência foram ‘desastrosos’ e revelaram descumprimento da legislação.
Ela afirmou, ainda, que o réu negou a prática do crime, e a prova é imprestável para embasar qualquer decisão e sentença de condenação. “Os depoimentos dos policiais [homem e mulher] são desastrosos, principalmente o do policial [homem], o qual não soube esclarecer como e porque o réu foi levado à delegacia”.
Ao g1, Sales afirmou que no dia do crime estava passando pela rodovia e chegou a ser abordado pela Polícia Militar Rodoviária (PMR), que o liberou após revistá-lo e nada encontrar. “Falei para onde estava indo, falaram que eu estava roubando, mas como não tinha nada me liberaram”.
Na data em que foi conduzido à delegacia, estava fazendo bico. “Me abordaram falando que iriam me levar sem falar o que tinha acontecido. Cheguei na delegacia sem saber o que estava acontecendo e falei que ficaria em silêncio”.
O g1 entrou em contato com a Polícia Militar e com a Secretaria de Segurança Pública do Estado de São Paulo (SSP-SP), mas não obteve retorno até a última atualização desta reportagem.
Vidro do guincho estilhaçado durante perícia do Instituto de Criminalística após roubo em rodovia no litoral de SP — Foto: Reprodução
VÍDEOS: Mais assistidos do g1 nos últimos 7 dias
Publicar comentários (0)