Em política, já vou logo explicando, clivagem significa separação ou diferenciação dos grupos sociais, por razões ideológicas, religiosas, culturais, econômicas ou étnicas.
Cheguei a essa palavra pouco usual ao destrinchar os diferentes recortes do último Datafolha, a mais completa pesquisa já realizada sobre o atual cenário eleitoral, que explicita claramente uma verdadeira luta de classes entre o eleitorado majoritário de Lula e o de Bolsonaro.
Sei os riscos que corro ao usar estas expressões, já que clivagem e luta de classes, a teoria desenvolvida pelo sociólogo alemão Karl Marx, viraram palavrões para as milícias das redes sociais, mas não encontrei outras melhores para analisar os números revelados esta semana pelo Datafolha, que provocaram um “impacto sísmico”, segundo Janio de Freitas, em sua coluna de hoje na Folha.
O motivo é a grande diferença desta pesquisa em relação a todas as outras divulgadas ultimamente, que mostravam uma aproximação entre os índices de intenções de votos dos dois candidatos, enquanto o Datafolha revelava uma larga vantagem de 21 pontos de Lula sobre Bolsonaro, com 54% dos votos válidos, podendo a eleição ser decidida já no primeiro turno.
Para entender esta contradição é preciso olhar para os perfis dos eleitores de um e de outro, sem falar nos perfis dos institutos de pesquisa que abundam nesta campanha.
De um lado, Lula reúne a ampla maioria dos votos dos mais pobres, dos menos escolarizados, dos negros, das mulheres, dos nordestinos, dos católicos, dos desempregados e dos jovens, que constituem a maioria da população brasileira, e por isso lhe dão 48% das intenções de voto.
De outro, Bolsonaro cresce apenas entre os mais ricos, os empresários, os que têm ensino superior, as regiões do agronegócio, as corporações militares e os evangélicos (assim mesmo, aqui há um empate técnico, com o presidente numericamente à frente, 39% contra 36%), o que o leva a atingir 27% no conjunto do eleitorado.
Pode-se constatar também que estes são os setores da sociedade mais beneficiados nos governos do ex-presidente e do atual presidente. Cada um colhe o que planta, como se dizia antigamente, quando fui aluno do curso de Ciências Sociais da Universidade de São Paulo, aquele valhacouto de “comunistas”, onde Fernando Henrique Cardoso era professor.
Grosso modo, é a clivagem que Karl Marx encontra entre a classe dos proletários e a da burguesia dentro da sociedade capitalista, e que se convencionou chamar de esquerda e direita nos tempos modernos.
Não vejo muito como isso possa mudar abruptamente nas próximas pesquisas, já que se trata de votos consolidados, segundo o Datafolha, deixando pouco espaço para qualquer novidade. É muito difícil corintiano virar palmeirense e vice-versa, ou que eles passem a torcer por um time do Ceará ou de Mato Grosso do Sul, faltando apenas quatro meses para a final do campeonato eleitoral.
Vida que segue.
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