Martinho Lutero acreditava que as palavras do reformador tcheco Jan Hus foram uma previsão que se cumpriu nele. Ele escreveu sobre isso ao comentar um Edito Imperial promulgado em 1531:
– Eu, Dr. Martinho, fui chamado para esse ofício e fui compelido a doutor, sem qualquer iniciativa minha, mas por pura obediência. Então eu tive que aceitar o ofício de doutor e fazer um juramento de que eu pregaria e ensinaria com fidelidade a minha tão amada Sagrada Escritura. Enquanto eu estava engajado no ensino, o papado cruzou meu caminho e queria me impedir. Mas não me impedirá. No nome e na vocação de Deus, eu andarei sobre o leão e sobre a víbora e pisarei com meus pés no filhote de leão e no dragão. E isso que começou durante a minha vida se completará após minha morte. São Jan Hus profetizou de mim… Assarão um ganso agora (porque ‘Hus’ significa ‘ganso’), mas em 100 anos ouvirão um Cisne cantar e terão que aguentá-lo. E assim será, se Deus quiser”.
Em 1515, exatamente 100 anos depois da morte de Jan Hus, foi o ano em que Lutero começou a lecionar sobre a Epístola aos Romanos. Segundo seu próprio relato, ele foi convencido da justificação pela fé com base em Romanos 1:17, desencadeando a eclosão da Reforma Protestante. Lutero reacendeu o fogo que se iniciou justamente um século antes:
– Quando eu era um estudante de teologia em Erfurt, aconteceu de chegar às minhas mãos, certo dia, na biblioteca do mosteiro, um volume dos sermões de Jan Hus. Ao ler na capa daquele trabalho as palavras, Sermões de Jan Hus, em mim imediatamente acendeu o desejo de apurar, por meio da leitura daquele livro que escapou das chamas e estava conservado numa biblioteca pública, quais heresias ele havia disseminado. Eu me abatia pelo espanto ao ler o livro e estava preenchido por uma surpresa difícil de descrever ao procurar por um motivo pelo qual um homem tão grandioso – um doutor, tão digno de veneração e tão poderoso na exposição das Escrituras – foi queimado até a morte.
O filósofo alemão Rudolf Eucken (Prêmio Nobel da Literatura em 1908) expressou que, a renovação da religião aviltada só podia triunfar se aparecesse uma personalidade soberana – Lutero – em quem as correntes espirituais que circulam através da Reforma se tornaram carne e sangue.
Segundo David S. Schaff, a origem da significação da Reforma Protestante não pode ser devidamente compreendida sem que se conheçam os fatos da vida de Lutero e a oposição feita a seu ensino. Mais que qualquer outro personagem na história, Lutero moldou os pressupostos que definem o Protestantismo.
Martinho Lutero deu início a um mar de mudanças e reformas que abalariam o mundo para sempre. Diante desse sustentáculo, gosto da interpretação do teólogo luterano Paul Althaus, que se referiu a Lutero como um “oceano”.
Para os protestantes ortodoxos, Lutero foi o cavaleiro divino, um Moisés, um Sansão (demolindo o templo dos filisteus), um Elias, até mesmo o Quinto Evangelista e o Anjo do Senhor. Para o famoso reformador francês Calvino, meu sempre honrado pai. Para o reformador suíço Zuínglio, o Davi fiel. Para os pietistas, foi o bondoso apóstolo da conversão. Os nacionalistas alemães celebravam-no como herói do povo e pai de seu país. Significativamente, os textos de Lutero podem ser citados em defesa de cada uma dessas caricaturas. Hans Holbein, famoso pintor alemão, retratou Lutero como, o “Hércules Alemão”.
Para os protestantes, Lutero foi um arauto da liberdade de pensamento, um homem enviado por Deus, o restaurador dos primitivos ensinamentos do Cristianismo, que tinham sido remendados ou pervertidos pelas interpretações humanas. Elogiado pelos bispos católicos alemães contemporâneos, um testemunho evangélico e mestre da fé. Para um renomado historiador alemão moderno, o “meteoro” Martinho Lutero.
Lutero não procurou nenhuma honra para si mesmo. Por seu próprio testemunho, ele devia tudo a Cristo. A história de sua vida confirma esse testemunho. E, quanto mais ele enfrentava oposição de Roma, mais se aprofundavam suas convicções bíblicas. Lutero não se tornou um reformador porque atacou as indulgências; ele atacou as indulgências porque a Palavra já havia criado raízes profundas em seu coração.
Era um homem de luta, quando os tempos clamavam pela guerra; um homem entre os homens, integralizando a mais humana personalidade. Sua missão foi a de realizar por meio de batalhas aquilo que, segundo a conclusão a que chegara, seria impossível que se cumprisse por outros meios.
Sua coragem heroica, profunda paixão, firme integridade, seu zelo contagiante e todas as demais virtudes que ele reúne são frutos de sua fé. Esse homem, sozinho, produziu um impacto tão profundo sobre a Igreja e sobre o mundo que, ainda hoje, influencia todos os cristãos que creem na Bíblia.
Dizem que apenas dois outros teólogos na história da Igreja, Agostinho e Aquino, se aproximam da estatura de Lutero. Se um homem deve ser julgado pela influência que exerceu sobre as opiniões permanentes e sobre os destinos do mundo cristão, Lutero é, depois de são Paulo, a figura mais notável.
Quinhentos anos depois de Martinho Lutero haver pregado as 95 Teses, a mensagem da Reforma Protestante é mais necessária do que nunca, um clamor emergencial para reafirmarmos a mensagem de Jesus Cristo no século 21… diante de uma Igreja corrupta, imoral, apóstata e um mundo globalizado, pouco reconciliado!
Entre os inúmeros gigantes na história da Igreja, Lutero me encorajou de forma letal, titânica, vulcânica, apaixonante, intrigante e desafiadora…
Trechos do livro, Martinho Lutero: O Cisne de Deus que Ascendeu aos Céus (2021, p. 13-23) – Autor, Lawrence Maximo.
Lawrence Maximo é cientista político, analista internacional de Israel e Oriente Médio, professor e escritor. Mestrando em Ciência Política: Cooperação Internacional (ESP), Pós-Graduado em Ciência Política: Cidadania e Governação, Pós-Graduado em Antropologia da Religião e Teólogo. Formado no Programa de Complementação Acadêmica Mastership da StandWithUs Brasil: história, sociedade, cultura e geopolítica do Oriente Médio, com ênfase no conflito israelo-palestino e nas dinâmicas geopolíticas de Israel. Escreve artigos para o jornal Gazeta do Povo.
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