G1 Mundo

A história da ‘rebelde’ que deixou família, percorreu quilômetros a pé e será a primeira santa da Argentina

today15 de novembro de 2023 6

Fundo
share close

No fim de outubro, Francisco aprovou o que a igreja católica considera ter sido um milagre de Mama Antula: a cura de uma freira que apresentava infecção generalizada no corpo e teria recuperado a saúde no início dos anos 1900 após Antula interceder por ela.

Nascida em 1730 em Santiago del Estero, na Argentina, Mama Antula fundou a Santa Casa de Exercícios Espirituais de Buenos Aires. Ela morreu em 7 de março de 1799, e seus restos mortais estão na igreja de Nuestra Señora de la Piedad, na capital do país.

Francisco é entusiasta da causa de Mama Antula desde que era cardeal — com nome Jorge Bergoglio. Ainda arcebispo em Buenos Aires, o pontífice demonstrava admiração particular e sempre repetia uma frase: “Esta mulher vale ouro”.



Mama Antula é considerada uma leiga consagrada, já que não entrou para o convento, apesar de também não ter se casado. É o que explica Filipe Domingues, vaticanista que mora em Roma e possui doutorado em Ciências Sociais na Pontifícia Universidade Gregoriana.

“Os leigos são as pessoas que não são nem sacerdotes nem religiosos de uma congregação religiosa, como por exemplo franciscanos e beneditinos”, diz.

“No caso dela, ela fez uma consagração específica. Algumas pessoas resolvem se consagrar mesmo sem entrar em uma instituição oficialmente, sem se tornar freira. Ela não era uma freira. Ela era uma mulher leiga e parece que isso até marcou um pouco a saída da família. Ela foi meio rebelde, não quis nem casar nem virar freira”, explica.

“Rebelde” é também como o jornal argentino “El Clarín” descreve Mama Antula. “Foi uma mulher disruptiva, rebelde, que desafiou os poderes máximos: a coroa espanhola e a igreja católica. A missão que abraçou até a morte foi continuar após a expulsão dos jesuítas da América”, diz o texto.

Quando os jesuítas foram expulsos do país, María Antonia, então com 15 anos, havia acabado de concluir seus estudos na ordem e falava quíchua, língua indígena dos países da Cordilheira dos Andes. Por isso, decidiu sair andando, literalmente, difundindo os pensamentos em que acreditava, por quilômetros e durante anos.

💭 Contexto histórico… Em 1773, o papa Clemente XIV eliminou os jesuítas da estrutura da igreja. Isso aconteceu por questões da época envolvendo as coroas portuguesa e espanhola, a igreja católica e a colonização da américa, como explicado em reportagem da BBC de 2016 (leia aqui). Os jesuítas só foram “reincorporados” novamente em 1814.

Seguindo as normas da igreja para a canonização, Mama Antula já havia sido beatificada em 2016 — que é o passo anterior ao da canonização, quando a pessoa vira santo mesmo, segundo a crença católica.

“Para ser beato, existe uma autorização para que essa devoção se difunda na igreja local, onde começou o processo. Naquela igreja local fica autorizada a devoção a essa pessoa. Já na canonização, ela é apresentada para o mundo inteiro, para toda a igreja”, explica Domingues.

E como alguém vira santo? Primeiro, cria-se uma fama de santidade, o que Mama Antula foi conquistando enquanto viajava o país a pé pregando a palavra da igreja.

“Ela cuidava dos pobres, tinha casas de regime espiritual que ela conduziu, ela viajou o país inteiro a pé. Então, ela ficou muito popular, principalmente entre os mais pobres. Essa vida meio diferente, de altruísmo muito grande, de evangelização, leva a uma fama de santidade, mas até essa pessoa morrer fica só essa essa fama mesmo. Quando a pessoa morre, geralmente há uma grande devoção e algumas pessoas começam a rezar pela intercessão dessa pessoa porque elas acreditam nela sendo uma pessoa santa”, diz Domingues.

Depois, cabe a quem for a autoridade religiosa local identificar essa fama e fazer uma investigação prévia.

“Se ele acha que realmente vale a pena abrir um processo para que a igreja reconheça, ele recolhe as informações localmente e apresenta isso no Vaticano num departamento que chama Dicastério das Causas dos Santos”, diz Domingues. Ainda leva mais um tempo de investigação até que a pessoa seja beatificada e todo o processo costuma levar anos.

Por isso, há uma expectativa de que o papa, um argentino, canonize Mama Antula no seu país, segundo o jornal “La Nación”. “Estamos entusiasmados por pensar que ele vá canonizá-la aqui”, disse ao jornal argentino Luisa Sánchez Sorondo, descendente da religiosa, já que um dos irmãos de Mama Antula era seu tataravô.

E Francisco, assim como Mama Antula, também é da ordem dos jesuítas.

Também ao “La Nación”, María Emilia Saldivio, que hoje administra a casa fundada por Mama Antula, disse acreditar ser uma resposta divina às orações dos argentinos, país majoritariamente católico, há anos em grave crise econômica (a inflação beira 140%). O país também vive dias de eleição tensa, com um segundo turno sendo disputado entre um economista considerado outsider, Javier Milei — e que já criticou publicamente o papa — e o atual ministro da Fazenda do país, Sergio Massa.

“Esta é uma notícia há muito esperada que nos chega num momento de grande angústia devido à situação do país”, disse Saldivio.

No Vaticano ou na Argentina, a canonização de Mama Antula é esperada para o início de 2024.




Todos os créditos desta notícia pertecem a G1 Mundo.

Por: G1

Esta notícia é de propriedade do autor (citado na fonte), publicada em caráter informativo. O artigo 46, inciso I, visando a propagação da informação, faculta a reprodução na imprensa diária ou periódica, de notícia ou de artigo informativo, publicado em diários ou periódicos, com a menção do nome do autor, se assinados, e da publicação de onde foram transcritos.

Avalie

Post anterior

‘virou-uma-cidade-fantasma’,-diz-palestina-refugiada-em-sp-que-cresceu-no-bairro-mais-bonito-de-gaza

G1 Mundo

‘Virou uma cidade fantasma’, diz palestina refugiada em SP que cresceu no bairro mais bonito de Gaza

A jovem engenheira mecatrônica, hoje com 29 anos, mora em São Paulo desde agosto de 2022 e acompanhou o bombardeio por meio de notícias e de informações que chegavam pela família. O pai, mãe, dois irmãos, irmã, avó e a cunhada de Ronza testemunharam a destruição. Hoje, eles estão na fronteira sul de Gaza. Ronza AbuJayyab, engenheira palestina de 29 anos, foi reconhecida como refugiada pelo governo brasileiro em outubro […]

today15 de novembro de 2023 7

Publicar comentários (0)

Deixe uma resposta

Seu endereço de email não será publicado. Os campos obrigatórios estão marcados com *

Esse site utiliza o Akismet para reduzir spam. Aprenda como seus dados de comentários são processados.


0%