Por meio de um número de telefone russo, ligamos para mais de uma dúzia de centros de recrutamento dizendo, caso questionassem, que estávamos perguntando em nome de um irmão.
Todos aqueles que responderam confirmaram que tudo continuava como antes.
De Kaliningrado, no oeste, a Krasnodar, no sul, ninguém acreditava que o grupo estava sendo dissolvido.
Na cidade ártica de Murmansk, uma mulher do clube esportivo Viking confirmou que ainda estava contratando mercenários para a guerra na Ucrânia.
“É para lá que estamos recrutando, sim. Se alguém quiser ir, é só me ligar e marcamos um dia.”
A longa lista de pontos de contato de Wagner está localizada principalmente em clubes de luta, incluindo escolas de artes marciais e clubes de boxe.
Várias pessoas que atenderam o telefone enfatizaram que os novos membros estavam assinando contratos com o próprio grupo mercenário, não com o Ministério da Defesa russo.
Os contatos dos escritórios de recrutamento de Wagner ainda estão ativos e insistindo que tudo continua normal — Foto: GRUPO WAGNER/via BBC
“Não tem absolutamente nada a ver com o Ministério da Defesa”, disse um homem do clube esportivo Sparta em Volgogrado. “Nada parou, ainda estamos recrutando.”
A exigência para que os mercenários se transferissem para o Ministério da Defesa, afetando assim o Grupo Wagner e seu chefe Yevgeny Prigozhin, estava no cerne do levante armado que explodiu no fim de semana passado.
Foi o maior desafio à autoridade do presidente Putin em seu governo de mais de 20 anos, apesar de o Kremlin se esforçar para tentar parecer que a resposta do líder russo ao episódio foi forte e fundamental para evitar a escalada do conflito.
No entanto, o processo criminal contra os mercenários foi arquivado, em um país onde vários ativistas da oposição estão cumprindo longas penas de prisão apenas por se manifestarem contra a guerra da Rússia contra a Ucrânia.
Até mesmo o líder do Wagner foi liberado, aparentemente se mudando para a Belarus – embora o jato particular de Prigozhin tenha sido rastreado voando de volta para a Rússia na noite de terça-feira.
E seu exército, que marchou sobre Moscou e atirou em helicópteros e em um avião em pleno voo, ainda não parece ter sido impactado.
“Estamos trabalhando. Se algo tivesse mudado, eles teriam nos contado. Mas não há nada”, esclareceu uma recrutadora em Krasnodar, no sul da Rússia.
O salário de um mercenário do Wagner continua sendo generosos 240 mil rublos (cerca de R$13 mil) por mês; os contratos são de seis meses.
Na quinta-feira, o presidente do comitê de defesa no parlamento da Rússia disse que Prigozhin havia sido avisado anteriormente de que o prazo para o Grupo Wagner ser dissolvido pelo Ministério da Defesa não era negociável.
“O Ministério da Defesa disse que todos os grupos devem assinar contratos, e todos começaram a fazer isso. Todos, exceto o Prigozhin”, comentou Andrei Kartapolov, se referindo ao motim como um ato de traição.
“Ele foi informado de que o Wagner não participaria mais da Operação Militar Especial”, em referência à guerra da Rússia contra a Ucrânia. “Também não obteria financiamento ou recursos materiais.”
Vladimir Putin, que passou anos negando qualquer vínculo oficial com o grupo Wagner, mudou o discurso repentinamente após o motim do fim de semana. Aparentemente tentando reduzir a relevância de Prigozhin, Putin afirmou que o grupo era 100% financiado pelo Estado russo.
Os aspectos práticos da sobrevivência do Wagner, portanto, não são claros.
No sábado, Putin assinou uma lei que indica que apenas o Ministério da Defesa pode agora recrutar nas prisões russas, o que anteriormente era uma fonte importante de novos combatentes do Wagner no conflito com a Ucrânia.
Mas a campanha de recrutamento mais ampla do grupo continua.
Em Volgogrado, o homem com quem falamos disse que se alguém se inscrevesse hoje, “poderia distribuí-lo amanhã” e confirmou que Belarus agora era um possível destino.
No início desta semana, o líder de longa data de Belarus, Alexander Lukashenko – que se orgulha ao descrever seu papel como mediador do fim do levante de sábado – disse que os combatentes do Wagner são bem-vindos por lá.
Ele sugeriu que o exército bielorrusso tinha muito a aprender com eles.
Um membro bielorrusso do Wagner, que atende pela alcunha de “Brest”, deu a entender que o grupo seria uma boa proteção para Lukashenko antes das eleições parlamentares do próximo ano, caso houvesse mais protestos em massa contra seu governo autoritário.
Em um vídeo postado no Telegram e filmado em local desconhecido, “Brest” também lembrou que a fronteira com a Belarus fica “a menos de 300 quilômetros de Kiev”. Foi como uma ameaça velada.
Presidente de Belarus, Alexander Lukashenko, durante fala pública em Minsk no dia 27 de junho de 2023 — Foto: Assessoria de imprensa da presidência de Belarus/via REUTERS
Ainda não há sinais de que os mercenários do Wagner estejam se mudando para a Belarus.
“Tudo está como antes, por enquanto. Nada mudou”, disse uma mulher em Saratov, centro da Rússia, confirmando que ainda estava recrutando homens para lutar na Ucrânia.
“Todo mundo vai para Molkino, como de costume. Para o centro de treinamento. Eles obtêm todas as informações lá”, acrescentou ela, aparentemente se referindo a um campo de tiro anteriormente ligado ao Wagner no sul da Rússia.
Então, alguma coisa mudará depois de 1º de julho? “Espero que não. Não sei. Mas as pessoas ainda estão nos contatando, é claro.”
Com reportagem adicional de Anastassia Zlatopolskai
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