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Em Kiev, alunos e professores lutam para continuar a estudar

today25 de fevereiro de 2023 10

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Muitas cadeiras permanecem vazias em uma manhã de terça-feira de fevereiro na sala de aula da professora Gurnitskaya. À sua frente, apenas um punhado de crianças faz exercícios de francês. Eles são somente uma parte da classe. Na tela do computador colocado na mesa em frente à professora, aparecem os avatares digitais de outros três alunos que estão acompanhando o curso remotamente.

Desde o início do ano letivo, em setembro, as salas de aula de muitos estabelecimentos de ensino estão de cara nova, como a escola nº 49, localizada no centro da capital ucraniana, que oferece classes bilíngues em francês, a partir do primeiro ano do ensino fundamental.

“Das 611 crianças que o estabelecimento costuma acolher, cerca de 200 seguem aulas presenciais, 266 estão no exterior e as demais ainda moram na Ucrânia, mas saíram de Kiev”, na maioria dos casos, foram para regiões do oeste do país, menos expostas ao conflito, detalha a diretora Alla Souleymanova.



Exército russo invadiu a Ucrânia em 24 de fevereiro de 2022

Em um ano de guerra, o sistema educacional ucraniano teve que se adaptar. A região de Kiev está relativamente bem. Em outras partes do país, como Kharkiv, segunda maior cidade da Ucrânia, que ainda vive sob a ameaça de ataques russos, as portas das escolas permanecem fechadas e o ensino é feito exclusivamente à distância.

“Para os cursos online, temos dois sistemas diferentes”, especifica a diretora.

“As crianças que ainda estão na Ucrânia seguem os cursos tradicionais. Quem está no exterior já tem muito o que fazer, pois é educado no país de acolhimento, então damos um jeito de adaptar o ensino. Eles podem ter aulas durante as férias escolares, por exemplo”, explica.

Uma organização complexa, mas todos parecem se unir para garantir a continuidade educacional, apesar do conflito.

“Desde 1991, a escola organiza cursos de idiomas e culturais na França. Já fomos para Normandia, Montpellier, Nice, Cannes, Paris”, conta Alla Souleymanova, que está no comando da instituição.

Em seu escritório que mais parece um armário de curiosidades, óculos meia-lua no nariz, ela não hesita em usar sua autoridade natural e em falar de sua longa gestão como diretora, que dura mais de 20 anos. 

A diretora Alla Souleymanova mostra fotos, em seu computador, do abrigo subterrâneo usado durante alerta à bomba. — Foto: RFI/Aurore Lartigue

Os vínculos estabelecidos com a França por sua instituição, ao longo de todos esses anos, se mostraram cruciais no dia 24 de fevereiro.

“Quando estourou a guerra, às 6h, liguei para todos os nossos parceiros, todas essas escolas com as quais fazemos intercâmbio há 33 anos para saber se poderiam receber nossas crianças na França. Todos, sem exceção, aceitaram”, conta.

Muitos pais decidiram fugir de Kiev o mais rápido possível. Alla Souleymanova lembra de uma mãe que partiu para Paris com oito crianças amontoadas em seu carro. “O principal naquela época era salvar as crianças”, diz ela. Eles foram recebidos pelo Institut La Tour, uma instituição privada parisiense. 

Em meio ao caos, eles deixaram o país sem autorização dos pais para sair do território. “Mas o diretor concordou em responder por todas nossas crianças. Ainda me dá arrepios contar isso”, diz ela.

“Depois, comecei a organizar o processo pedagógico”, em um país que acabava de sair de dois anos de Covid. “Já tínhamos todas as ferramentas para organizar o ensino à distância, inclusive nossa plataforma baseada no Teams (aplicativo). Apesar dos alunos espalhados pelo mundo, conseguimos reformar as turmas e terminar o ano letivo”, conta a diretora.

Determinação para estudar

Em um ano, o clima escolar mudou muito. Nos corredores, os alunos agem normalmente, de maneira descontraída. Todos parecem ter se acostumado a conviver com a guerra como pano de fundo. 

Alexandra, uma estudante do segundo ano, foi uma das que deixaram a Ucrânia no início do conflito. Ela passou o final do ano letivo de 2022 em uma escola perto de Nice. Em setembro, com a mãe e a irmã, tomaram a decisão de voltar, mas ela permanece registrada na França, caso a situação volte a piorar.

Quando questionada se consegue estudar com calma, ela encolhe os ombros.

“Nos meses de novembro e dezembro, houve muitos cortes de energia, foi difícil fazer os deveres de casa. Mas hoje está um pouco mais estável. É certo que há alertas, cortes de energia, explosões, mas continuamos a lutar para estudar”, diz.

O dia estava calmo. Nenhum alerta soou. “Em caso de alerta aéreo, temos um protocolo a seguir: três sirenes longas tocam e cada professor desce com sua turma para o abrigo subterrâneo”, explica a diretora. “Cada turma tem seu lugar, todos sabem para onde ir e os cursos podem continuar”, diz.

“No começo, tive muito medo. Mas agora isso não me importa ”, diz Alexandra. “Infelizmente, as crianças se acostumaram”, lamenta a diretora.

Desde o início da guerra, reformas melhoraram o labirinto de porões que, há apenas um ano, servia para guardar equipamentos e materiais. No dia anterior, Alexandra e seus colegas passaram duas horas no local, durante as aulas de história e de literatura. Mas a jovem admite que com a confusão e o barulho é preciso um pouco de “determinação” para continuar a estudar.

Em seu escritório, a diretora quer nos mostrar uma última coisa. “Essa bandeira, foi o pessoal do front que mandou para a gente”, comenta com orgulho. “Organizamos muitas ações para os soldados. Preparamos comida, doces, as crianças fazem desenhos. Na bandeira azul e amarelo pendurada no canto de uma reprodução do brasão de armas da Ucrânia, estão inscritas palavras de agradecimento: “Em nome do Exército ucraniano, com nossa sincera gratidão aos alunos e professores da escola nº 49”. 

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Por: G1

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