Foi um Mundial marcado também por debates e polêmicas fora dos gramados.
A começar pela escolha do país sede, o Catar, devido ao seu histórico duvidoso de respeito aos direitos humanos.
Também por conta do calendário, já que o torneio foi disputado em dezembro, quando acontecem as principais ligas e torneios de clubes do mundo. A ideia era evitar o verão do hemisfério norte e seu intenso calor que eleva as temperaturas no Catar a cerca de 50º C.
Em termos futebolísticos, foi uma das Copas do Mundo mais competitivas das últimas décadas, diminuindo o fosso entre as potências históricas da modalidade e as equipes consideradas de “menor status”.
Confira alguns legados positivos e negativos que o Mundial no Catar nos deixou.
Um torneio muito disputado
Multidão de torcedores do Marrocos usa sinalizadores durante comemoração em Londres, na Inglaterra, após a equipe garantir a vaga inédita na semifinal da Copa do Mundo — Foto: Henry Nicholls/Reuters
Embora ainda seja cedo para apurar as razões, a verdade é que a Copa do Mundo no Catar foi um dos torneios mais competitivos das últimas décadas, em que o fosso entre grandes e pequenos escretes se tornou mais estreito do que nunca.
O maior exemplo foi a atuação prodigiosa da seleção de Marrocos, primeira seleção árabe e africana da história a chegar a uma semifinal de Copa do Mundo. Na sua jornada bem sucedida a equipe marroquina empatou com a Croácia e venceu Bélgica e Canadá, terminando o Grupo F em primeiro lugar com apenas um gol sofrido.
Na fase mata-mata os marroquinos eliminaram nos pênaltis a poderosa Espanha e venceram por 1 a 0 a seleção portuguesa, de Cristiano Ronaldo e outros craques experientes.
Antes do início do torneio, o Marrocos ocupava a 22ª posição no ranking da Fifa.
A este feito juntam-se outros menores, mas não menos importantes: por exemplo, a Austrália, que dividiu o grupo com França e Dinamarca, conseguiu chegar às oitavas-de-final pela segunda vez na sua história.
Outra grande atuação foi a do Japão, que além de vencer as ex-campeãs mundiais Alemanha e Espanha, assumiu a liderança do grupo E.
Ficará também para a história a vitória da Arábia Saudita sobre a Argentina, que adiou por alguns dias o sonho da Albiceleste de se sagrar campeã mundial.
Será preciso esperar o comitê técnico da Fifa (Federação Internacional de Futebol) analisar o que aconteceu nesta Copa do Mundo, mas muitos já sugerem que o calendário, no inverno boreal e em metade das principais ligas do planeta, tem muito a ver com isso.
Mundo árabe se uniu para torcer pelo Marrocos e Arábia Saudita. — Foto: Getty Images via BBC
Além das polêmicas, o Catar 2022 deixa um legado histórico para o mundo árabe.
A maioria de seus cidadãos ainda são pessoas comuns que este mês mostraram seus costumes e valores para milhões ao redor do mundo.
“No final, temos muito mais coisas que nos unem do que nos dividem”, disse um catariano à BBC News Mundo, o serviço em espanhol da BBC, durante a primeira semana da Copa do Mundo.
A comunhão entre torcedores locais e estrangeiros tem sido total. Com base na tolerância de cada um, foram forjando-se amizades e momentos que não serão apagados da memória de quem esteve ali.
Mas, acima de tudo, a Copa do Mundo deixa uma imagem de união entre os torcedores árabes, considerando as disputas políticas que os países da região enfrentaram nas últimas décadas, como o próprio Catar e a Arábia Saudita.
As bandeiras não importavam. Catarianos, egípcios, marroquinos e libaneses vibraram com a vitória da Arábia Saudita sobre a Argentina.
E depois todos se uniram com a jornada emocionante do Marrocos até as semifinais.
Para muitos árabes, essa foi uma oportunidade de superar estereótipos. Agora, muitos deles esperam que esse efeito dure.
Gramado do Estádio 974 — Foto: Débora Gares/ge.com
Uma das grandes críticas que o Catar recebeu foi o montante de dinheiro que gastou para criar a infraestrutura necessária para sediar um torneio dessas dimensões.
Esse investimento deixou um legado impossível de ignorar: os estádios removíveis.
No total, para o Catar 2022, seis estádios foram construídos do zero e dois já existentes foram reformados.
Entre eles está o 974, com capacidade para 40 mil espectadores, construído com contêineres usados e começou a ser desmontado após a partida entre Brasil e Coreia do Sul, pelas oitavas de final.
E a ideia é que as peças desse estádio sejam enviadas para um país a ser definido, para estimular o desenvolvimento do futebol.
É a primeira vez que um estádio construído para uma Copa do Mundo pode ser reaproveitado em outra parte do mundo, o que é uma inovação completa em termos de sustentabilidade.
Tratamento de trabalhadores migrantes
Antes da Copa do Mundo havia um intenso debate sobre o tema dos direitos humanos, especialmente no que diz respeito aos trabalhadores migrantes.
O jornal britânico The Guardian e algumas organizações de direitos humanos apontaram que cerca de 6 mil trabalhadores migrantes morreram na construção da infraestrutura para sediar a Copa do Mundo.
A própria organização do torneio estimou a cifra em 500 trabalhadores que morreram na construção dos estádios.
E embora o governo local tenha feito um esforço para melhorar as condições dos milhões de trabalhadores migrantes que vivem no país, a verdade é que ainda há muito por fazer.
Para José Carlos Cueto, enviado especial da BBC News Mundo em Doha, a situação dessas pessoas continua precária.
“Por exemplo, eles não puderam curtir a Copa do Mundo como os milhares de turistas que vieram a Doha, porque não tinham permissão para isso”, diz.
As restrições à comunidade LGTBQIA+
Uma das maiores polêmicas ocorridas tanto antes do início do torneio quanto nos primeiros dias das competições foram as restrições às manifestações de solidariedade à comunidade LGTBQIA+.
Braçadeira de capitão com o lema “One Love” (Um só amor). — Foto: Alex Livesey – Uefa
Alguns espectadores não foram autorizados a usar roupas com a bandeira do arco-íris ou enviar mensagens de solidariedade a esta comunidade.
Além disso, algumas seleções europeias como Alemanha, Dinamarca e Inglaterra solicitaram que seus capitães usassem uma braçadeira com a frase “One Love” (Um só amor) exibindo as cores da bandeira do arco-íris.
No entanto, a Fifa anunciou que se algum jogador usasse a braçadeira não seria penalizado com multa, conforme estipulado, mas com sanção esportiva.
A Fifa e a organização do evento, por sua vez, argumentaram que a ideia era não permitir manifestações políticas dentro do torneio.
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