Os moluscos foram estudados como tese de doutorado da pesquisadora Mayana Karoline Fontes, que diz ter usado aproximadamente 165 mexilhões para as análises.
A metade foi coletada no mar, nas áreas citadas acima, e apresentaram grande concentração da droga. A outra parte veio de um cultivo e, portanto, era considerada saudável. Estes moluscos foram expostos à cocaína para avaliar o impacto no organismo.
A gente viu alteração no DNA. A cocaína causou alterações no DNA dos mexilhões.
— Mayana Karoline Fontes, pesquisadora
O coordenador da pesquisa, o professor doutor Camilo Seabra Pereira explicou que, inicialmente, a baía de Santos foi monitorada durante cada estação do ano para verificar a qualidade da água. Em todas foram confirmadas a presença da cocaína e de benzoilecgonina.
A coleta dos mexilhões ocorreu durante a primavera, quando se reproduzem. De acordo com Pereira, eles precisam das gônadas dos moluscos, que são como os órgãos reprodutivos.
Essas gônadas servem como biomarcadores, ou seja, indicam respostas sobre uma eventual contaminação por cocaína. “Não só do ponto de vista químico, mas microbiológico, esses animais não têm qualidade para o consumo humano“, disse Pereira.
Segundo Pereira, a pesquisa surpreendeu ao mostrar que a cocaína acumulada nos mexilhões era maior do que na água, ou seja, estavam bioacumulando.
Mayana explicou que o processo para determinar a concentração de cocaína no tecido de cada mexilhão se chama liofilização. Procedimento que remove toda a água do organismo e deixa apenas um pó, que foi filtrado com um solvente orgânico para extrair a droga.
Captação de dados e riscos
Experimento em laboratório expondo mexilhões a cocaína — Foto: Camilo Seabra Pereira
Os moluscos foram analisados entre 2018 e 2022, durante a tese de Mayana pela Universidade Federal de São Paulo (Unifesp). Os resultados apontam que os mexilhões podem acumular cocaína em áreas frequentadas por moradores e turistas para banho, pesca e colheita, o que gera preocupação.
Tem que intensificar o monitoramento desse tipo de substância. […] a gente está falando de um animal muito consumido como alimento
— Mayana Karoline Fontes, pesquisadora
A pesquisadora ressaltou que não existe um protocolo de monitoramento desse tipo de substância no ambiente e, portanto, não há como dizer se a concentração de cocaína encontrada nos mexilhões é segura. “A gente não sabe o que acontece com as pessoas que comem o animal contaminado”.
O trabalho foi feito em parceria com a Universidade Estadual Paulista (Unesp) e a Universidade Santa Cecília (UniSanta). Ele foi financiado pela Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado (Fapesp) e Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPQ).
Para os pesquisadores, os dados ambientais dessas substâncias são essenciais para identificar potenciais fontes poluidoras, bem como o impacto que causam nos ecossistemas costeiros.
A presença da droga no mar, de acordo com Pereira, teria origem no esgoto lançado pelas moradias irregulares. O material acaba nos canais de drenagem e vão parar no estuário. “Nesses lugares que a gente achou cocaína, encontramos cafeína. É um indicador de esgoto doméstico não tratado”.
Experimento em laboratório expondo mexilhões a cocaína — Foto: Camilo Seabra Pereira
Dados de ocorrências com cocaína e benzoilecgonina em compartimentos ambientais marinhos ainda são limitados. A tese de Mayana aponta que são poucos os estudos sobre a contaminação de águas superficiais.
Efeitos nos moluscos e humanos
Os pesquisadores confirmaram que a cocaína desregula o sistema endócrino nos mexilhões, que adoecem. “Apresentaram estresse oxidativo e alterações em enzimas e proteínas, que são muito importantes para a defesa do organismo, na produção de gametas, na reprodução”, disse Mayana.
Apesar da pesquisa não ter analisado as consequências dos mexilhões contaminados no organismo humano, Pereira alerta que os moluscos podem afetar a saúde de quem os consome.
Pesquisadores Mayana Fontes (à esq.) e Camilo Seabra (à dir.) — Foto: Arquivo Pessoal e Carlos Abelha/g1
Em nota, a Companhia de Saneamento Básico do Estado de São Paulo (Sabesp) afirmou que segue rigorosamente todas as exigências previstas por lei e dentro dos padrões de lançamento de esgoto previsto no licenciamento ambiental.
A empresa também disse que realiza um monitoramento contínuo para garantir que o efluente [resíduos produzidos] saia da estação dentro de todos os parâmetros das normas vigentes.
A companhia ressaltou que está desenvolvendo o maior programa de saneamento ambiental da costa brasileira, o Onda Limpa’ na Baixada Santista.
Ainda de acordo com a Sabesp, um dos desafios são as áreas de ocupação irregular, onde a lei não permite implantar redes de água e esgoto sem regularização e, dessa forma, a companhia trabalha junto aos órgãos municipais para avançar e ampliar as redes de saneamento na região.
Pesquisa apontou que mexilhões são capazes de acumular cocaína em áreas frequentadas por moradores e turistas para banho, pesca e colheita, o que gera preocupação com a saúde humana.
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