“Não posso mais rezar para o mesmo Deus das pessoas que atualmente estão tentando destruir minha comunidade e destruir nossas vidas”, disse Rashlin, em referência à agenda anti-LGBTQIA+ de alguns membros do governo.
Segundo um levantamento do Ministério da Saúde de Israel feito com dados de 2020, 40% de integrantes da comunidade trans no país já tentaram suicídio.
“Muitos de seus amigos transgêneros se suicidaram recentemente”, conta Rashilin.
Diferente de outras mulheres ortodoxas, Rashlin decidiu parar de cobrir o cabelo. Ela quis se distanciar da comunidade.
“Casais religiosos (heterossexuais) podem andar pela rua de mãos dadas, mas se eu estiver usando um lenço na cabeça, não posso segurar a mão de outra mulher por levantar questões”, explica esta engenheira de computação de 43 anos.
Israel dispõe das leis LGBTQIA+ mais progressistas do Oriente Médio. Só na última década, a tolerância entre relacionamentos do mesmo sexo aumentou, inclusive entre os religiosos.
A discussão sobre a identidade de gênero ainda é, entretanto, um tabu na comunidade ortodoxa, cujos partidos estão presentes no atual governo de coligação liderado por Benjamin Netanyahu.
Rashlin e Hadar, sua esposa, celebraram alguns anos atrás um casamento em Israel, que não foi reconhecido pelas autoridades religiosas ou estatais. Apesar de o país reconhecer uniões registradas no exterior, o matrimônio igualitário não é permitido.
“O preço a se pagar ficou alto demais para lidar com esse conflito entre ser um casal LGBTQIA+ e parte da comunidade ortodoxa”, diz Hadar Rashlin, 30.
Yael Rashlin é mãe de cinco filhos, três deles de um casamento antigo.
Rotem Sorek, responsável pela associação Maavarim, que defende a comunidade LGBTQIA+, garante que este número de tentativas de suicídio é ainda maior entre a comunidade ortodoxa.
“A angústia vai além. Muitas vezes precisam enfrentar a rejeição não só dos familiares, mas também de sua comunidade. E, por isso, correm ainda mais perigo”, disse Sorek.
O rabino ortodoxo Benny Lau acha a situação especialmente preocupante.
“Quando você desempenha o papel de um rabino, de um líder, você deve se encarregar da vida de cada indivíduo”, disse Lau.
A hostilidade de muitos rabinos em relação às identidades transgênero faz parte de sua ampla batalha contra a modernidade, diz Lau. Ele argumenta que a lei judaica “está sujeita à interpretação” a fim de “encontrar justificativas” para as diferentes identidades.
Esta postura liberal se choca, no entanto, com as posições defendidas por alguns parlamentares israelenses, principalmente os da coligação que está à frente do governo desde dezembro.
O ministro das Finanças, Bezalel Smotrich, e seu companheiro da coalizão, Avi Maoz, vice-ministro no gabinete de Netanyahu, expressaram suas veementes posturas anti-LGBTQIA+.
“Não acho que existirão leis anti-LGBTQIA+ imediatamente. Mas, mais do que as leis, me preocupo com o trabalho diário do governo”, declarou a engenheira de computação Shani Armon, de 29 anos, outra mulher transgênero e ortodoxa.
No caso de Yael Rashlin, a preocupação é tanta que ela considera “deixar Israel se a situação ficar impossível”.
“Por que é tão difícil?”, ela se questiona sobre a capacidade de sua comunidade ortodoxa de aceitar sua identidade. “Por que somos consideradas um espinho na garganta?”.
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